Introdução & Nomenclatura do Amarelinho
Na vasta e diversa galeria de árvores que compõem as florestas brasileiras, existem aquelas que se destacam por uma silhueta de uma elegância e de uma simetria singulares. A Terminalia glabrescens, conhecida por uma profusão de nomes populares que refletem sua cor e seus usos, como Amarelinho ou Cerne-amarelo, é uma dessas obras de arte da arquitetura botânica. Ela pertence ao nobre gênero *Terminalia*, famoso por sua “arquitetura de pagode”: os galhos crescem em patamares horizontais e bem definidos ao longo do tronco, criando uma copa estratificada, leve e de uma beleza oriental que se destaca na paisagem. Mas sua nobreza não se resume à sua forma. É uma árvore de madeira valiosa, de casca medicinal e de uma adaptabilidade que a permite prosperar em quatro dos grandes biomas brasileiros, sendo um dos pilares da biodiversidade de nossas matas secas.
Seus múltiplos nomes populares são uma crônica de sua profunda integração com as culturas locais. “Amarelinho” e “Cerne-amarelo” são referências diretas à bela cor dourada de sua madeira. Nomes como “Merindiba” ou “Mirindiba” a inserem em um grupo de árvores de grande valor na Caatinga e no Cerrado. E nomes curiosos como “Maria-preta” ou “Pequi” (este último, uma confusão local com a famosa fruta do Cerrado) demonstram a intimidade e a variabilidade com que o povo brasileiro batiza a sua flora. O nome científico, Terminalia glabrescens Mart., é uma descrição precisa de sua identidade. O gênero, *Terminalia*, refere-se ao hábito de agrupar as folhas na porção *terminal* dos ramos. O epíteto específico, *glabrescens*, vem do latim e significa “que se torna glabro”, descrevendo suas folhas e ramos que, muitas vezes, nascem com pelos e se tornam lisos com a maturidade.
O Amarelinho é uma espécie nativa de uma vasta área da América do Sul, com uma presença marcante e de ampla distribuição no Brasil. É uma árvore emblemática dos biomas Amazônia, Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica, sendo uma das espécies mais características e importantes das Florestas Estacionais Deciduais e Semideciduais. É uma árvore que sente o ritmo das estações, perdendo suas folhas para florescer e frutificar em um espetáculo de renovação. Ter uma semente de *Terminalia glabrescens* em mãos é ter a promessa de cultivar uma árvore que é um monumento de beleza arquitetônica, uma fonte de madeira nobre e um pilar insubstituível para a restauração de nossas matas secas.
A história desta árvore é uma celebração da forma e da função. Sua arquitetura em pagode não é apenas um adorno; é uma estratégia otimizada para a captação de luz em florestas com um dossel definido. Suas folhas que se tornam glabras, seus frutos alados e sua casca rica em taninos são todas respostas inteligentes aos desafios de seu ambiente. É uma planta que nos ensina sobre a elegância que pode existir na rusticidade e sobre a força que reside em uma estrutura bem projetada. Cada semente alada que se desprende de sua copa é um pequeno planador, uma miniatura da arquitetura perfeita da árvore-mãe, pronta para levar sua herança de beleza e de resiliência para novos horizontes.
Aparência: Como reconhecer o Amarelinho?
Reconhecer um Amarelinho é identificar uma árvore de uma beleza escultural, de uma arquitetura que parece ter sido desenhada por um mestre oriental. A Terminalia glabrescens é uma árvore de porte médio a grande, que pode atingir de 10 a 30 metros de altura. Sua característica mais distintiva é a sua arquitetura de copa, conhecida como “modelo de Rauh” ou “arquitetura de pagode”. O tronco é reto e colunar, e os galhos crescem em verticilos ou patamares horizontais e bem espaçados, como os andares de um pagode. Esta disposição cria uma copa estratificada, arejada e de uma simetria e elegância extraordinárias, que a torna inconfundível na paisagem. A casca é grossa, de cor acinzentada, e se torna fissurada com a idade.
As folhas são a origem do nome do gênero. Elas são simples, de filotaxia alterna, e se agrupam em rosetas na porção terminal dos ramos, acentuando a arquitetura em patamares. As folhas são de formato obovado (com a parte mais larga no ápice), de textura firme (cartácea a coriácea) e, como o nome *glabrescens* sugere, são geralmente cobertas por pelos avermelhados quando jovens, mas se tornam lisas e de um verde-brilhante com a maturidade. Na base da lâmina ou no topo do pecíolo, é comum a presença de um par de glândulas.
As flores são pequenas, de cor branca, creme ou esverdeada, e se agrupam em inflorescências do tipo espiga, que são cachos alongados e finos que surgem nas axilas das folhas, perto da ponta dos ramos. As flores não possuem pétalas; o que vemos são cinco sépalas e dez estames proeminentes. Embora não sejam individualmente vistosas, a floração é abundante e muito perfumada, atraindo uma grande quantidade de insetos polinizadores. A árvore é decídua, e a floração ocorre geralmente quando ela está com poucas ou nenhumas folhas, no final da estação seca.
O fruto é uma obra de arte da aerodinâmica. É um tipo de fruto seco e indeiscente chamado betulídeo, que é uma sâmara com 4 ou 5 asas longitudinais e papiráceas. O fruto inteiro, com seu corpo central e suas asas dispostas simetricamente, assemelha-se a uma pequena hélice ou a um carrapicho de estrela. Ao amadurecer, os frutos, de cor palha a castanha, pendem em grande quantidade dos ramos, aguardando o vento que os levará em sua jornada.
A semente única está protegida no corpo central e lenhoso do fruto. É através deste invólucro alado e engenhoso que o Amarelinho garante que sua prole viaje para longe e encontre um local adequado para germinar e iniciar a construção de um novo e elegante pagode na paisagem.
Ecologia, Habitat & Sucessão do Amarelinho
A ecologia da Terminalia glabrescens é a de uma especialista em florestas sazonais, uma árvore que prospera sob o ritmo de uma estação seca bem definida. Seu habitat principal são as Florestas Estacionais Deciduais e Semideciduais, que ocorrem nos biomas da Caatinga, do Cerrado, da Mata Atlântica e da Amazônia. Ela é uma das espécies mais nobres e características destas matas secas, preferindo solos bem drenados e de boa fertilidade, sendo frequentemente encontrada em encostas e vales. Sua ampla distribuição por quatro biomas a consagra como uma espécie de grande sucesso ecológico e de notável plasticidade.
Na dinâmica de sucessão ecológica, o Amarelinho é classificado como uma espécie secundária tardia ou clímax, mas com um crescimento relativamente rápido para uma madeira de lei. É uma espécie de longa vida, que compõe o dossel superior das florestas maduras. Suas plântulas são tolerantes a um certo grau de sombreamento, mas a árvore adulta necessita de luz plena para florescer e frutificar abundantemente. A sua estratégia de perder as folhas na estação seca (decidualidade) é um mecanismo crucial para a conservação de água.
As interações com a fauna são focadas em sua reprodução. A polinização de suas pequenas e numerosas flores perfumadas é realizada por uma grande diversidade de insetos, principalmente abelhas nativas de diferentes espécies. A floração, que ocorre em um período de transição entre a estação seca e a chuvosa, a torna uma planta apícola de grande importância, oferecendo uma fonte abundante de pólen e néctar e sustentando a comunidade de polinizadores.
A dispersão de suas sementes é uma magnífica parceria com o vento. A estratégia da anemocoria é garantida por seus frutos multi-alados. Quando os frutos amadurecem, durante a estação seca e ventosa, eles se desprendem da copa. As 4 ou 5 asas papiráceas funcionam como as pás de uma hélice, fazendo com que o fruto gire rapidamente sobre si mesmo enquanto cai. Este voo giratório, como o de uma semente de ácer, diminui a velocidade da descida e aumenta enormemente o tempo de exposição ao vento, que pode então carregá-lo por centenas de metros de distância. É uma das mais belas e eficientes estratégias de dispersão pelo vento da nossa flora.
Usos e Aplicações do Amarelinho
O Amarelinho é uma das árvores mais valiosas e versáteis do Brasil, uma fonte de madeira de alta qualidade, de compostos medicinais e de serviços ecossistêmicos que o tornam um pilar da economia e da cultura em diversas regiões. As aplicações da Terminalia glabrescens refletem sua natureza robusta e a riqueza de sua constituição.
Seu uso mais nobre e economicamente importante é na madeira, que é conhecida por muitos nomes, como Cerne-amarelo ou Merindiba. A madeira é de excelente qualidade, sendo moderadamente pesada, dura, de grã atraente e com alta durabilidade natural. O cerne possui uma bela coloração amarelo-dourada, que lhe rendeu o nome de “Amarelinho”. É uma madeira muito valorizada, utilizada na construção civil de luxo (vigas, caibros, assoalhos, esquadrias), na marcenaria fina para a fabricação de móveis de alta qualidade, painéis decorativos, e na construção naval, para a confecção de barcos e canoas. Sua resistência e beleza a colocam entre as madeiras mais nobres do Brasil.
Na medicina tradicional, a casca do Amarelinho, rica em taninos, é muito valorizada. O chá preparado com sua casca é um poderoso adstringente, sendo um remédio popular para o tratamento de diarreias, disenterias, inflamações da garganta (usado em gargarejos) e para a cicatrização de feridas e úlceras, quando usado externamente. Sua casca também é uma fonte industrial de taninos para o curtimento de couro.
O valor ecológico da espécie é imenso. Por seu crescimento relativamente rápido para uma madeira de lei e por sua adaptabilidade, ela é uma espécie estratégica para a silvicultura sustentável e para a composição de sistemas agroflorestais de ciclo longo. É também uma espécie fundamental para a restauração de matas secas e matas ciliares degradadas. Além de tudo, é uma excelente planta apícola, sustentando as abelhas e a produção de mel.
Cultivo & Propagação do Amarelinho
Cultivar um Amarelinho é um investimento em uma das mais belas e valiosas árvores do Brasil. A propagação da Terminalia glabrescens a partir de sementes é um processo que reflete a natureza de uma árvore de floresta, recompensando o cultivador com uma planta de crescimento rápido e de múltiplos dons.
O ciclo começa com a coleta dos frutos, que deve ser feita quando as estruturas aladas estão secas e de cor palha, geralmente após caírem da árvore. A semente se encontra no corpo central do fruto. Para facilitar a germinação, as asas podem ser removidas. As sementes podem apresentar algum grau de dormência e se beneficiam da imersão em água por 24 horas antes do plantio.
A semeadura deve ser feita em um substrato bem drenado e rico em matéria orgânica, em sacos de mudas ou tubetes. As sementes devem ser cobertas com uma fina camada de terra. A germinação geralmente ocorre em 20 a 40 dias, e a taxa de sucesso é considerada alta para sementes frescas.
As mudas de Amarelinho devem ser cultivadas a pleno sol ou a meia-sombra. O crescimento da árvore é rápido a muito rápido para uma espécie de madeira de lei, podendo atingir de 2 a 3 metros de altura em dois anos no campo. Esta velocidade, aliada à qualidade de sua madeira, a torna uma das espécies mais promissoras para a silvicultura no Brasil.
O plantio da Terminalia glabrescens é ideal para plantações comerciais de madeira, para a restauração de matas estacionais e ciliares e para a composição de sistemas agroflorestais. É também uma magnífica árvore ornamental e de sombra para grandes espaços, como parques e fazendas, onde sua arquitetura de pagode pode ser plenamente apreciada.
Referências utilizadas para o Amarelinho
Esta descrição detalhada da Terminalia glabrescens foi construída com base em fontes científicas de alta credibilidade e na vasta documentação sobre a silvicultura e os usos de nossas árvores nativas. O objetivo foi criar um retrato completo que celebra a beleza arquitetônica, a resiliência e o imenso valor desta árvore tão importante. As referências a seguir são a base de conhecimento que sustenta esta narrativa.
• Ribeiro, R.T.M.; Marquet, N.; Loiola, M.I.B. Combretaceae in Flora e Funga do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <https://florabrasil.jbrj.gov.br/FB6917>. Acesso em: 26 jul. 2025. (Fonte primária para dados taxonômicos, morfológicos e de distribuição oficial).
• Lorenzi, H. 1992. Árvores Brasileiras: Manual de Identificação e Cultivo de Plantas Arbóreas Nativas do Brasil, Vol. 1. 1ª ed. Editora Plantarum, Nova Odessa, SP. (Referenciado como *Terminalia brasiliensis*, é a mais importante fonte para informações práticas sobre cultivo, usos da madeira e características gerais).
• Carvalho, P.E.R. 2003. Espécies Arbóreas Brasileiras, Vol. 1. Embrapa Informação Tecnológica, Brasília, DF. (Compêndio detalhado da Embrapa com informações silviculturais e ecológicas).
• Stace, C.A. 2010. Combretaceae. Flora Neotropica Monograph, 107, 1-369. (A mais completa revisão da família para as Américas).
• Pio Corrêa, M. 1984. Dicionário das Plantas Úteis do Brasil e das Exóticas Cultivadas. 6 vols. Ministério da Agricultura/IBDF, Rio de Janeiro. (Obra clássica de referência para os múltiplos nomes populares e usos).
• Martius, C.F.P. von. 1824. Nova Genera et Species Plantarum, vol. 1, p. 42. (Publicação original onde a espécie foi descrita pela primeira vez).













